1.07.2013

Canas


Uma por uma, apanhou todas as canas. Todas, sem excepção, estavam vazias. Pô-las ao ombro e voltou à estrada. Em busca de mais rios e mares.
No cruzamento parou. Apoiou-se com um pé enquanto o outro permanecia nervoso no pedal. Olhou ao fundo, calculando a miopia e pensou vislumbrar ao longe um charco.
Contudo, era perto de mais. Ali não havia peixe. Nem outro animal. Arriscou e continuou estrada fora. Em busca do desconhecido, mas sempre remoendo e mastigando a ideia que o ia couçando nas costas. Não era ideia alguma, apenas as canas, as muitas canas que se iam encavalitando e relembrando da paixão, essa paixão da pesca em charco alheio que cultivara desde a infância.
Passados uns kms parou. Estava cansado, desgastado. As pernas pesavam, as costas vergavam ao peso do património. O frio esse, implacável, gelava-lhe os dedos. A lingua presa, a respiração difícil. Uma a uma, todas tiveram um único destino. Um fogo crepitante, que lhe aquecia a alma. E que lhe fazia lembrar todos os peixes que lhe escaparam.
Verteu as canas uma a uma para o fogo que o ia aconchegando lentamente. estendeu as mãos à frente. regozijou-se. Regozijou-se num longo momento em que o calor por momentos ultrapassava o tremor interior que escondia, sem poder por inteiro albergar o tremor que perpetrara. O regozijo, tal como o fogo, fitava-se lentamente, numa chama que ao invés de lhe permitir vislumbrar um novo enlace, lhe lembrava a cada instante estar perante um retorno.Num movimento fugaz, levou uma mão ao fogo na ânsia de salvar uma, alguma, nem que a mais pequena das canas. bolas. falhara e quase queimara a mão.

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